"...por conhecer de antemão (o que só é dado a um homem prudente) os demônios que estão se formando, esses são facilmente vencíveis. Mas quando, por falta desse conhecimento, permite-se que esses demônios cresçam até o ponto em que todos podem reconhecê-los, aí não há mais remédio".
Niccolò Machiavelli** Pensador político italiano, foi secretário e historiador da República Florentina no Século XVI.
À primeira vista, a expressão "gerenciamento de crise" carrega consigo uma contradição semântica. Como gerenciar um fenômeno que desafia o conceito do que é rotineiro e previsível? Atualmente, com a rapidez da propagação das informações e a complexidade das relações globais, uma crise pode prejudicar, abalar ou até mesmo destruir a imagem de uma empresa, grupo ou instituição em pouco tempo, independente do seu grau de credibilidade ou solidez. Daí a importância do tema para instituições nacionais e permanentes como o Exército Brasileiro, que detém, junto à população brasileira, um dos maiores índices de respeito e credibilidade do País. Tal imagem, construída ao longo de toda a sua existência e assinalada pela participação em episódios marcantes da vida nacional, deve ser preservada por todos os seus integrantes.
O que é Crise
Crise é diferente de problema. É um evento imprevisível com potencial para provocar prejuízos significativos a uma instituição e, conseqüentemente, aos seus integrantes. Se mal administrada, pode macular a credibilidade e a imagem da instituição. No Exército, ela pode ocorrer, dependendo do escalão considerado, de diversas formas e amplitudes . Acidentes com vítimas em treinamento militar ou na avaliação de um armamento a ser adotado, denúncias de irregularidades administrativas ou da participação de integrantes da Força em ilícitos e envolvimentos em problemas ambientais são, entre outros, exemplos de fatos que podem gerar uma crise. Fundamental, em qualquer caso, é agir com rapidez, de modo a identificar a crise, analisá-la, verificar sua amplitude e tomar as providências necessárias para amenizar suas conseqüências.
O Grupo de Gerenciamento
Para fazer frente à crise, é fundamental, nos escalões mais elevados, constituir um grupo de gerenciamento, que nada mais é do que a articulação de pessoas para esse fim. Esse grupo deve avaliar os potenciais riscos e preparar planos para agir preventivamente em relação a cada um deles, bem como gerenciar a crise já instalada. Nas situações de normalidade, o grupo deve simular ocorrências plausíveis de acontecer e, principalmente, quando a crise surgir, buscar o apoio dos mais diversos segmentos, tais como os públicos interno e externo da Força, a área governamental e a mídia - enfim, todos que possam auxiliar na manutenção da imagem da Instituição. O grupo deve ser formado por profissionais das áreas jurídica, financeira, de pessoal, de operações, de comunicação social e de inteligência, entre as mais importantes. É fundamental que possua poder de decisão, grande equilíbrio emocional e, de acordo com o problema, esteja em condições de convocar membros de outras áreas relacionadas ao fato específico para melhor adequar a solução.
O local de Gerenciamento
Uma sala deverá ser preparada para reunir o grupo de gerenciamento, de modo rápido e eficiente. O local precisa dispor de todos os meios necessários para os profissionais que irão gerenciar a crise, incluindo comunicação adequada, equipamentos de informática e de gravação (áudio e vídeo), informações ou acesso facilitado à(s) pessoa(s) ou órgão(s) envolvido(s), além de fácil consulta às normas preestabelecidas sobre o assunto a ser gerenciado e conexão à Internet e televisão para acompanhamento ininterrupto dos noticiários.
A Crise e a Comunicação Social
Nos casos de crise, cresce de importância a função do militar de Comunicação Social, que deverá contribuir para preservar, proteger e, muitas vezes, reconstruir a imagem da Instituição. É necessário que os fatos sejam informados aos órgãos de Comunicação Social assim que ocorram, de forma que possam ser treinados porta-vozes, mobiliados postos de atendimento e respondidos os questionamentos da imprensa.
O que fazer
1) Calma! Prepare-se! Não saia falando sem saber o que de fato aconteceu. Declare à imprensa que você irá se informar e voltará a falar. E volte!
2) Não tema! Fale!Se você não falar, alguém vai falar por você. Só que não necessariamente a verdade. Seja ágil em sua resposta para a mídia.
3) Mentir, jamais!A mentira tem pernas curtas. E, quando alguém descobrir que você está mentindo, o último e mais precioso recurso que lhe resta, a boa vontade da opinião pública, estará perdido.
4) Assegure-se de estar sendo compreendido.Tudo é uma questão de comunicação. Será que os jornalistas e a opinião pública estão de fato entendendo e aceitando o que você está falando? Cuidado com termos técnicos e evasivos.
5) Não especule. Não brinque. Não subestime.Não dê a impressão de que você é arrogante ou age de má-fé.
6) Jamais diga "sem comentários" ou "nada a declarar".Essas frases, antipáticas, dão a impressão de que você tem algo a esconder.
7) Trate de ser identificado como honesto.A imagem e a credibilidade, no momento de crise, são decisivas. O que vale aqui é aquele dito antigo: "À mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta".
8) Lembre-se ainda:
em situações em que há vítimas, não deixe de informar, imediatamente, à família e prestar solidariedade e apoio a ela, por intermédio de um grupo de acompanhamento, treinado para isso. É inaceitável os familiares tomarem conhecimento por outros meios, bem depois do ocorrido;
monte um comitê para gerenciar a crise e sua comunicação;
prepare press-releases, depoimentos, listas de perguntas e respostas, testemunhas favoráveis, etc.;
agende entrevistas e atenda bem à imprensa;
publique uma nota explicando a posição da Instituição;
monitore a mídia e corrija erros;
mantenha ativos os canais de comunicação com o escalão superior;
se necessário, estabeleça uma central de atendimento para o público; e
monitore a reação dos diversos públicos afetados e cuide de mantê-los bem informados.
O que não fazerCuidado com a postura na condução de uma crise. Evite agir das seguintes formas:
1) "Estou sendo injustiçado".Mesmo que você tenha agido de boa-fé, não se julgue perseguido pela imprensa ou por determinados setores da sociedade. Isso não resolve e ainda agrava a situação.
2) "Não é problema meu".Não tente se preservar. Saiba que gerenciar a crise com competência pode significar a manutenção da imagem da Instituição e o reconhecimento de todos pelo seu trabalho.
3) "Me respeite".Por mais envolvido que você esteja, a questão não é pessoal. Menos envolvimento emocional facilita o raciocínio equilibrado.
4) "Não quero incomodar meus chefes".Não demore. Comunique a crise imediatamente aos escalões mais altos. O fator tempo é fundamental.
5) "Foi um episódio isolado e não vai acontecer novamente".Não ignore sinais de alerta. Resolva problemas potencialmente graves da primeira vez, antes de se tornarem crises.
6) "Isso não vai dar em nada"."Efeito avestruz" não ajuda. O que você prefere: um fim horroroso ou um horror sem fim?
7) "Seguimos todas as normas, padrões e regulamentos da Instituição".E quem se importa com isso?
8) "Legalmente estamos cobertos".Ter respaldo legal em crises não significa vencê-las. A questão é de imagem e não apenas de leis. Aspectos éticos são mais relevantes.
9) "Foi um problema menor e não há motivo para pânico".Não se iluda. Uma pequena rachadura num dique pode significar catástrofe.
10) "Não negligencie o público interno".Respeitado e bem informado, ele pode ser seu aliado.
Orientações para os Pequenos EscalõesÉ importante ressaltar que as orientações aqui contidas estão mais voltadas para os altos escalões da Instituição, que terão melhores condições para montar a estrutura adequada e tomar as providências sugeridas. Aos pequenos escalões, é pertinente uma adaptação dos dados aqui lançados e a procura do apoio do escalão superior quando em momentos de crise.
Prevenção da Crise
Para finalizar, lembre-se de que, em situação de crise, o preparo conta muito mais que a sorte. Seguem algumas medidas para prevenção de crise:
prepare uma assessoria qualificada para desenvolver um programa de treinamento em gerenciamento de crise e elaborar um manual de crises, no qual constem os procedimentos a serem adotados pelas partes envolvidas;
envolva todo o seu estado-maior;
faça um midia-training (treinamento para lidar com a imprensa) de crise;
faça um brainstorming (técnica utilizada para estimular o pensamento criativo em busca de uma solução) de possibilidades de crise em seu local de trabalho. A pior crise é aquela para a qual não estamos preparados;
desenvolva um extenso questionário e prepare as respostas para as possíveis perguntas;
desenvolva idéias-força;
crie um comitê de crise e o reúna ao menos uma vez por mês para novas avaliações; e
em determinadas situações, institua a figura de um negociador, que conheça o linguajar usado pelos interlocutores e não pertença ao grupo de gerenciamento de crise. Ele deve ter autonomia para tomar decisões e ser amigo da(s) família(s) da(s) vítima(s), quando for o caso.
Bibliografia:SUSSKIND, Lawrence; FIELD, Patrick. Em crise com a opinião pública. SãoPaulo: Futura,1997.NEVES, Roberto de Castro. Crises empresariais com a opinião pública. Riode Janeiro: Mauad, 2002.COMO Sobreviver na crise, sem crise. Propaganda, São Paulo: nº 486, p.9-12, ago. 1993.BREITINGER, Jacqueline. A arte de apagar incêndios. Exame, São Paulo: v.32, nº 15, p. 118-119, jul. 1998.CORREIA, Cristiane. Para sair do pesadelo. Exame, São Paulo: v. 35, nº 7,p. 44-45, abr. 2001.CALDINI, Alexandre. Como gerenciar a crise. Exame, São Paulo: v. 34, nº 2,p. 116-118, jan. 2000.:
Cel RR PMMT Léo G. Medeiros
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